26 de dezembro de 2006

Ataque à publicidade


O veto à propaganda é remédio excessivo para lidar com pequenos abusos cometidos por alguns publicitários

Primeiro foram os cigarros que tiveram sua publicidade banida no país. Depois, foi a propaganda de bebidas alcoólicas que caiu na mira das autoridades sanitárias. E, na cidade de São Paulo, foi aprovada há poucas semanas uma lei que, na prática, vai acabar com a chamada mídia externa, isto é outdoors e anúncios indicativos. Agora, chegou a vez das crianças. Congresso, Ministério Público e governo discutem restrições a comerciais voltados ao público infantil.Um observador desavisado poderia crer que o Brasil vive uma cruzada antipublicitária. Parece mais exato, porém, identificar aí a tentação legiferante -a vontade de resolver todos os problemas a golpes de caneta- que, em maior ou menor grau, acomete todos os ocupantes do poder.Embora a propaganda esteja envolvida em todos os casos mencionados acima, os produtos em questão são muito diferentes. Faz sentido limitar fortemente a publicidade de tabaco e álcool. Trata-se, afinal, de drogas psicoativas que provocam dependência. Ninguém deveria ser estimulado a ingeri-las.Além disso, a Constituição, em seu artigo 220, prevê restrições "à propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias". Mas produtos que não se enquadrem nessas categorias têm em princípio sua publicidade protegida pelos mesmos dispositivos constitucionais que garantem a liberdade de expressão.Daí não segue, é claro, que os anunciantes possam tudo ou que prefeituras devam renunciar a regular o uso do espaço urbano.No caso dos produtos para crianças, a auto-regulamentação parece uma solução mais razoável. As normas para o segmento aprovadas há pouco pelo Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária) são equilibradas e, ao que tudo indica, serão seguidas. A última coisa que um anunciante deseja é provocar a ira de clientes potenciais.Uma eventual proscrição da propaganda infantil, nos moldes da que vigora na Suécia, poderia trazer efeitos indesejados. Não é impossível imaginar um cenário em que, premidas pela queda de receitas, emissoras de TV baixassem ainda mais a já discutível qualidade da programação destinada às crianças.Já no que diz respeito aos outdoors paulistanos, poucos irão discordar de que a poluição visual na cidade se tornou excessiva e de que era necessário tomar providências. Lamentavelmente, porém, a prefeitura preferiu a solução fácil de vedar tudo, para não dar-se ao difícil trabalho de diferenciar as utilizações legítimas das abusivas.Não se enfrentam mosquitos com tiros de canhão. A proscrição da propaganda parece um remédio adequado para combater o uso de drogas, mas excessivo para lidar com os pequenos abusos cometidos por publicitários sem imaginação e por programadores de mídia mais afoitos. Mensagens publicitárias, com as vantagens e desvantagens que isso traz, tornaram-se parte da civilização ocidental. Essa é uma característica que dificilmente será alterada por leis e decretos.

Folha de São Paulo, sábado, 21 de outubro de 2006.

Nenhum comentário:

Postar um comentário